Desde que me tornei mãe, a realidade me impôs o título de mãe solo. A sociedade romantiza esse papel, criando rótulos supostamente elogiosos, como mãe guerreira. Ou pãe: pai e mãe ao mesmo tempo. Aparentemente, a que dá conta de tudo sozinha.
Das funções que precisei me encarregar sem contar com o pai da minha filha, meu maior desafio sempre fora as tomadas de decisão. Na minha imaginação, seria tudo mais leve se eu tivesse um parceiro que ao menos acenasse a cabeça validando meus posicionamentos. Mesmo que eu tivesse que continuar a frente de tudo. Porque aquela concordância acarretaria divisão de responsabilidades, caso alguma escolha feita não se mostrasse a melhor.
A começar pelas questões corriqueiras, será que minha forma de agir era realmente a mais adequada? Se ela tivesse febre de noite, até que ponto eu deveria dar um antitérmico e aguardar amanhecer, ou acionar o pediatra durante a madrugada? Era melhor tirar a chupeta na idade indicada pela odontopediatra e deixá-la chorando por dias até se acostumar, ou deveria aguardar até que ela ganhasse maturidade e desapegasse sozinha da chupeta? Como impor limites sem ser exageradamente flexível ou rígida?
Em relação às decisões maiores, o peso da maternidade solo era ainda maior. Qual o colégio mais adequado para minha filha? Qual o melhor momento para iniciar um curso de inglês? A carga de atividades extracurriculares estava muito extensa? A partir de que idade ela poderia dormir na casa de uma amiga?
Depois de mais de dez anos sendo a única responsável pela criação da minha filha, achei que eu já estava calejada. A sobrecarga materna havia me ensinado como era importante a divisão de tarefas e responsabilidades. A idealização de uma realidade diferente confirmava a importância da presença paterna na criação de um filho, principalmente nas tomadas de decisão.
Foi então que tive outra filha, num contexto diferente, e percebi que eu tinha conhecido somente um lado deste assunto: as consequências sobre a ausência paterna. Na verdade, meu conhecimento era nulo sobre a presença paterna e seus desdobramentos. Minha experiência no compartilhamento de responsabilidade era unicamente utópica.
Na minha segunda vivência criando uma filha, comecei a aprender, a partir da estaca zero, como ser mãe não-solo. Iniciei a descoberta sobre como exercer a maternidade sem precisar cobrir também, na medida do possível, o papel de pai. Como ser somente mãe, enquanto outra pessoa exerce o papel de pai. Apesar de não ser mãe de primeira viagem, tudo é inédito.
O fato é que esse aprendizado vem sendo menos intuitivo do que eu esperava, às vezes até mesmo incômodo. Preciso me esforçar para expor meus pontos de vista e estar aberta a críticas e ponderações sobre assuntos que não estou acostumada a dividir com ninguém. O processo de tomada de decisão compartilhada reduz não somente minha responsabilidade, mas também a autonomia que eu estava acostumada. Estou aprendendo a ceder, a negociar e a entender a parentalidade a partir de um ponto de vista diferente do meu.
O carinho da minha filha também é compartilhado. Isso me leva a um ciúme infantil e vergonhoso nas situações em que a pequena prefere o pai. Me esforço para encontrar meu papel na dinâmica familiar quando ela se machuca e procura o colo paterno chorando, por exemplo.
Ao me tornar mãe, adquiri um olhar diferente sobre o relacionamento entre mãe e filha, que até então eu só conhecia vivenciando o papel de filha. Da mesma forma, o exercício da maternidade não-solo apresenta um lugar de fala inédito e radicalmente diferente da maternidade solo. Que a soma das duas experiências me traga maturidade para enxergar o limite entre sobrecarga e autonomia. Apesar de sempre ter acreditado e militado sobre a importância na divisão de tarefas e responsabilidades na criação de um filho, a (falta de) experiência tem me proporcionado surpresas. Que essas vivências tão diferentes me ajudem a assimilar que não é necessário tentar dar conta de tudo sozinha para ser uma boa mãe.
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